sábado, 21 de novembro de 2015

Rubem Alves.

Os portugueses se horrorizaram ao saber que os índios matavam as pessoas e as comiam. Os índios se horrorizaram ao saber que os portugueses matavam as pessoas e não as comiam. Tudo depende do ponto de vista.

ESSE EST PERCIPERE AUT PERCIPI

Ilusionismos
Há séculos, reflexões e escritos procuram estabelecer algum parâmetro que permita dizer com certeza que aquilo que vemos, pensamos ou sentimos existe
Em 1980, o essencial Carlos Drummond de Andrade, já com 78 anos de idade, publicou o livro "A Paixão Medida" e nele inseriu uma provocação poética chamada "A Suposta Existência". Nas duas estrofes iniciais está o desafio: "Como é o lugar / quando ninguém passa por ele? / Existem as coisas / sem ser vistas? / O interior do apartamento desabitado, / a pinça esquecida na gaveta, / os eucaliptos à noite no caminho três vezes deserto, / a formiga sob a terra no domingo, / os mortos, um minuto / depois de sepultados, / nós, sozinhos / no quarto sem espelho?".
Ora, uma das mais antigas indagações humanas diz respeito à concretude e à existência efetiva do real; há séculos, reflexões e escritos procuram, tanto no Ocidente quanto no Oriente, estabelecer algum parâmetro que permita dizer com certeza que aquilo que vemos, experimentamos, pensamos ou sentimos existe de fato, não sendo apenas pura imaginação delirante ou ficção passageira. É clássica uma pequena história, de muitos e diferentes modos recontada, que diz ter um sábio chinês adormecido e sonhado que era uma borboleta. No sonho, a borboleta também dorme e sonha ser um sábio chinês. Quando acordam quem acorda? Quem acorda transformado em quê? Quem era quem ao despertar? Qual era a realidade e qual era o sonho?
Pode parecer perda de tempo refletir sobre coisas assim, mas a construção de referências confiáveis para qualquer ação ou pensamento é exatamente a base sobre a qual se assentam as elaborações da arte, da filosofia, da religião e da ciência. Por isso, no século 18, o bispo e filósofo irlandês George Berkeley também procurava uma referência confiável, especialmente para sustentar sua defesa extremada da supremacia do espírito sobre a matéria. Encontrou-a em um axioma latino (embora pudesse ser uma máxima publicitária atual): "Esse est percipere aut percipi" (ser é perceber e ser percebido). O que não é percebido não existe, ou seja, o que não é notado e distinguido perde efetividade.
Em 1944, o pensador francês Jean-Paul Sartre escreveu "Entre Quatro Paredes", uma de suas mais provocadoras peças de teatro. Encenada com adaptações diversas pelo mundo afora, tem um enredo básico: três pessoas que não se conhecem, sendo duas mulheres (a insolente Inês e a fútil Estelle) e um homem (o acovardado Garcin), morrem e, para surpresa completa, vão parar em um cômodo fechado, sem janelas, sem espelhos e quase sem móveis; ali, queiram ou não, terão de conviver por tempo indefinido e, é claro, de suportar-se obrigatória e reciprocamente.
Naquele lugar, o amanhã é sempre a eternidade da presença detestável de outras pessoas com as quais não se quer estar, mas não há como escapar dessa condição (como acontece com muita gente em férias forçadas, em famílias impostas, em casamentos cínicos, em empregos enfadonhos, em lazeres alienantes ou em feriados prolongados).
É nessa peça que se encontra o famoso e nem sempre incorreto vaticínio: "O inferno são os outros". Metáfora da vida contemporânea (já naquela época), a peça inquieta profundamente o mundo das plastificadas convenções sociais, das muitas e tolas vaidades estéticas, das perigosas elasticidades morais e, como complemento sólido, é um desesperador passeio pelo reino das hipocrisias, imposturas e dissimulações das quais somos capazes na breve existência. Há uma cena marcante para demonstrar a parceria entre a futilidade e o desprezo intencional: como não havia espelhos no cômodo -para a aflição da vaidosa Estelle-, esta precisa que as duas pessoas digam a ela como está a sua aparência. Nada dizem. Calam e a torturam com o silêncio, impedindo que saiba por outros como está ela mesma.
A ressurreição eventual do pensamento de Berkeley vem sendo feita de modo hiperbólico, exagerado, exaltado. Não é raro nos depararmos com aqueles que sucumbem aos apelos sombrios oriundos de algumas mídias que proclamam a importância de sermos vitimados por celebridades provisórias, famas instantâneas e personalidades velozmente dissolúveis. Parece que a única regra é ser percebido.
Riquezas aparentes, misérias reais...


MARIO SERGIO CORTELLA, filósofo.

Passagem das Horas - Fernando Pessoa.

"Não sei se a vida é pouco ou demais para mim.
Não sei se sinto de mais ou de menos, não sei
Se me falta escrúpulo espiritual, ponto de apoio na inteligência,
Consanguinidade com o mistério das coisas, choque
Aos contatos, sangue sob golpes, estremeção aos ruídos,
Ou se há outra significação para isto mais cômoda e feliz.
Seja o que for, era melhor não ter nascido,
Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,
A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,
A dar vontade de dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sair
Para fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas,
E ir ser selvagem para a morte entre árvores e esquecimentos,
Entre tombos, e perigos e ausência de amanhãs,
E tudo isto devia ser qualquer outra coisa mais parecida com o que eu penso,
Com o que eu penso ou sinto, que eu nem sei qual é, ó vida."

"ando muito completo de vazios.
meu órgão de morrer
me predomina.
estou sem eternidades
não posso mais saber
quando amanheço ontem.
está rindo de mim o amanhecer.
ouço o tamanho oblíquo de uma folha
atrás do ocaso foram os insetos.
enfiei o quanto que pude
dentro de um grilo o meu destino
essa coisas me mudam para cisco.
a minha independência tem algemas."

(Manoel de barros, in 'ignorãças'1993)
É próprio de minha pequenez de espírito, alcançar com dedos táteis e sufocantes,
no que erramos ao querer se dar?
 mas aos poucos, sem se permitir ou só por alguns instantes... 
Aliviar angústias,
 suprir necessidades.
escarro, penúria.
 Preocupar-se consigo e com o que parece vital.
 Necessário!
Ora, que importa se outros descalçaram sapatos para não ofender nossa fragilidade religiosa, nossas crenças  e anseios... Nosso âmago...
Dane-se o mundo
e, dane se os outros...
 De o meu egoísmo.
 Se entregue por essa noite. Vá embora ou sequer apareça.
Não há importância em sua história, sequer eu a tenho,
 o pouco da minha identificação,
você tem carregado, nas plaquetas de um exército que sequer disparei um tiro... os guardei esperando que morresse um dia, mas, como saber se estou vivo ainda,
 na ilusão de concretudes...
por sua boca, entrou o que não foi sentido no olhar... 
fugacidade
em nossas bobagens literais, filosofias toscas, apoiadas em livros, sendo externo a eles também.
 Confesse seus piores defeitos e 
promiscuidades... dúvidas...
queira a realidade triste, de não saber se é verdade,
se sempre foi intenso ou se nunca fomos personificados de nada,
 para aprender de fora o que também não se consegue olhar por dentro!!!


“Parece improvável que a humanidade em geral seja algum dia capaz de dispensar os ‘paraísos artificiais’, isto é, [...] a busca de auto transcendência através das drogas ou [...] umas férias químicas de si mesmo...
a maioria dos homens e mulheres levam vidas tão dolorosas - ou tão monótonas, pobres e limitadas, que a tentação de transcender a si mesmo, ainda que por alguns momentos, é e sempre foi um dos principais apetites da alma.”

(Aldous Huxley, escritor inglês)
Foucault afirma, o discurso da repressão parece ser ele mesmo coberto por uma aura de transgressão, como se o próprio falar de sexo e de sua proibição estivesse fora do alcance da lei. Como se fosse em si mesmo um ato revolucionário que promete um futuro libertador (e prazeroso). Isso explicaria toda a gama de sutilezas encontradas ao tratar do sexo em termos de repressão. Na solenidade das falas, na pose, no tom de voz, cheios de consciência da subversão. Como uma pregação, denunciando hipocrisias, revelando uma verdade, prometendo uma felicidade vindoura: “o enunciado da opressão e a forma de pregação referem-se mutuamente; reforçam-se reciprocamente”. 
(FOUCAULT, 1988, p. 13).

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

" QUANDO REFLITO SOBRE A BREVE DURAÇÃO DA MINHA VIDA, ABSORVIDA NA ETERNIDADE ANTERIOR E NA ETERNIDADE POSTERIOR, NO PEQUENO ESPAÇO QUE OCUPO, E MESMO NO QUE VEJO, FUNDIDO NA IMENSIDÃO DOS ESPAÇOS QUE IGNORO E QUE ME IGNORAM, ATERRO-ME E ASSOMBRO-ME DE VER-ME AQUI E NÃO EM OUTRA PARTE, UMA VEZ QUE NÃO EXISTE MOTIVO NENHUM PARA QUE EU ESTEJA AQUI E NÃO ALHURES, NESTE MOMENTO E NÃO EM OUTRO MOMENTO QUALQUER. QUEM ME COLOCOU EM TAIS CONDIÇÕES ??? POR ORDEM E OBRA DE QUEM ME FORAM DESIGNADOS ESTE LUGAR E ESTE MOMENTO ???
( PASCAL ).
"Enquanto um indivíduo reconhecer os pontos fortes e fracos de sua teoria, de sua arte, de sua religião, sua força ainda é escassa. O discípulo e o apóstolo que não tem olhos para a fraqueza da teoria, da religião e assim por diante, ofuscado pelo prestígio de seu mestre e por sua devoção para com ele, tem, por isso, habitualmente mais poder que o mestre. Sem os discípulos cegos, a influência de um homem e de sua obra nunca conseguiu ainda se difundir. Muitas vezes, ajudar no triunfo de uma ideia significa apenas associá-la tão fraternalmente com a estupidez, que o peso da última se torna também obrigatória a vitória da primeira". ( NIETZSCHE ).

domingo, 1 de novembro de 2015

A Globalização é uma Nova Forma de Totalistarismo

A globalização económica é compatível com os direitos humanos? Temos de fazer esta pergunta a nós próprios e ver que a resposta é que ou há globalização ou há direitos, por mais que os poderes tenham a hipocrisia de dizer que a globalização favorece os direitos humanos, quando o que faz é fabricar excluídos. A globalização é simplesmente uma nova forma de totalitarismo que não tem de chegar sempre com uma camisa azul, castanha ou negra e com o braço erguido; tem muitas caras e a globalização é uma delas. Devíamos voltar a Marx e a Engels para reverter a situação, ainda que seja pouco menos que politicamente incorrecto referirmo-nos a estes cadáveres da história quando a ideologia parece que morreu. 


José Saramago, in 'Turia (2001)'

A quem censurar?


Cada vez que me deparo com noticias que nos expõe enquanto um todo, enquanto sociedade, e tem sido muitas,  me pergunto com qual consciência tranquila e limpa estamos "cobrando" nossos políticos. 

Podemos argumentar, que essa noticia abaixo por exemplo, fala de uma parte de um todo, o que pode mesmo ser visto como verdade; mas, pensando friamente, em nossos pequenos atos, nossas pequenas corrupções diárias, deslizes... Um estacionar em vaga proibida, compra e venda de produtos, que são feitos com mão de obra análogas a escravidão, o sentar se em ônibus nos lugares de grávidas, idosos ou deficientes físicos, nosso não comungar de verdade com a dor ou miserabilidade dos outros, furar fila, vantagens indevidas, desrespeito e falta de gentileza no trânsito. delações...  Moralismo? Não. Sei que não há perfeição em mim, também faço parte de erros, aos quais me proponho ver; porém percebo que enquanto população, mudaremos muitas coisas, quando começarmos as mudanças através de nós mesmos. Claro que políticos corruptos devem ser julgados e presos e, que haja mesmo eficiência nessas prisões, para acabarmos com a ideia histórica da cadeia que só funciona para pobres e desfavorecidos. Mas, urgentemente, precisamos resolver nossa crise moral, ou seria ética?

 Gato" preocupante: 4,5 milhões de lares roubam serviço de TV paga no país


Colunas - Flavio Ricco
O malfeito é, entre tantos e enormes problemas, o maior na vida de todos os brasileiros. Nas várias crises que de vez em quando aparecem, como é o caso da atualmente em cartaz, sempre existe a preocupação em se levantar as mesmas e velhas questões que atormentam este país antes mesmo de Pedro Álvares Cabral botar os pés por aqui.

Quando, um dia, Pelé disse que o brasileiro não sabia votar, o mundo caiu na cabeça dele. Hoje, se constata, que até agora não aprendemos, caso contrário não estaríamos tão mal representados como sempre estivemos. Há um preço para toda escolha ruim. Quem consegue rapidamente se lembrar em qual vereador, deputado estadual ou federal e mesmo senador votou nas últimas eleições?

E aí se reclama de impostos cada vez mais altos, saúde e educação deficientes, transporte ruim, segurança que não existe e tantas outras carências em setores essenciais.

Mas alguém já parou para perguntar a si mesmo se está fazendo a sua parte? Evidente que o problema é muito amplo, mas só naquilo que nos diz respeito, como admitir que 4,5 milhões de lares brasileiros "gatunam" o serviço de TV paga? Este é um dado oficial. E, conforme levantamentos, é um universo que atinge as mais diferentes classes de pessoas, até mesmo aquelas que têm condições de contratar os trabalhos de uma operadora.

Convenhamos

Televisão não é produto de primeira necessidade na vida de ninguém.

Mas roubar os serviços de uma operadora é crime. Dá cadeia. A Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) e a Receita Federal do Brasil firmaram termo de cooperação para destruir milhares de decodificadores ilegais de TV paga que são apreendidos na região Sul do Brasil.

Sol com a peneira
 

A pirataria e a ilegalidade estão incrustadas na vida de algumas pessoas. As que querem tirar vantagem em tudo, e não se importam em prejudicar o próximo.

Que este termo de cooperação produza os efeitos que pretendemos. Exercer maior patrulha na tríplice fronteira já é um passo bem significativo, mas que também nos leva a esperar por outros. Que tal um "passeio" na Santa Efigênia.