terça-feira, 16 de outubro de 2012

Eu apresento a página branca. Contra: Burocratas travestidos de poetas Sem-graças travestidos de sérios Anões travestidos de crianças Complacentes travestidos de justos Jingles travestidos de rock Estórias travestidas de cinema Chatos travestidos de coitados Passivos travestidos de pacatos Medo travestido de senso Censores travestidos de sensores Palavras travestidas de sentido Palavras caladas travestidas de silêncio Obscuros travestidos de complexos Bois travestidos de touros Fraquezas travestidas de virtudes Bagaços travestidos de polpa Bagos travestidos de cérebros Celas travestidas de lares Paisanas travestidos de drogados Lobos travestidos de cordeiros Pedantes travestidos de cultos Egos travestidos de erosLerdos travestidos de zen Burrice travestida de citações água travestida de chuva aquário travestido de tevê água travestida de vinho água solta apagando o afago do fogo água mole sem pedra dura água parada onde estagnam os impulsos água que turva as lentes e enferruja as lâminas água morna do bom gosto, do bom senso e das boas intenções insípida, amorfa, inodora, incolorágua que o comerciante esperto coloca na garrafa para diluir o whisky água onde não há seca água onde não há sede água em abundância água em excesso água em palavras. Eu apresento a página branca. A árvore sem sementes. O vidro sem nada na frente. Contra a água. Arnaldo Antunes in Tudos
O menino não gosta de dançar, tem pânico de se apresentar em público. Mas é obrigado pela família a participar da quadrilha de festa junina, a caráter, as lágrimas escorrendo sobre o bigodinho pintado com o kajal da mãe. Atrapalha a dança, chateia a coleguinha com a qual faz par e ainda sofre o mico supremo de terminar a coreografia com a professora. "Tem que dançar, tem que perder a vergonha, tem que aprender". O menino não quer ir ao passeio da escola. Tem medo de ônibus, não gosta de ficar longe dos lugares onde se sente seguro – e só ele sabe o quanto demorou tanto para se acostumar com a rotina da própria escola. Mas os pais o levam cedinho, obrigam-no a se integrar ao grupo – o que não vai acontecer de fato até cessar o choro –, a entrar na fila, a partir sem qualquer vontade. "Tem que ir, tem que perder o medo, tem que participar". Não julgo. Mas tem o que mesmo?

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

POLITICA

A PROFESSORA, PERGUNTA AOS SEUS ALUNOS NO QUE SEUS PAIS TRABALHAM. UM A UM VÃO RESPONDENDO: ENGENHEIRO, PINTOR, MECÂNICO, PEDREIRO... SOMENTE JOAOZINHO EM SILÊNCIO. AO QUE ELA PERGUNTA: - E VC JOÃOZINHO, QUAL A PROFISSÃO DE SEU PAI? ELE RESPONDE, MEU PAI TRANSA POR DINHEIRO, E DANÇA EM BOATES PARA OUTROS HOMENS. A PROFESSORA SABENDO QUE NÃO ERA ESSA A PROFISSÃO DO PAI DO GAROTO, ESPERA A AULA ACABAR E LHE CHAMA. - JOÃOZINHO VC NÃO SABE QUE É MUITO FEIO MENTIR? EU SEI QUE SEU PAI É PÓLITICO, PORQUE NÃO FALOU A VERDADE PARA SEUS AMIGOS??? AO QUE JOÃOZINHO RESPONDE: DESCULPA PROFESSORA, MAS É QUE EU FIQUEI COM TANTA VERGONHA !!!

quinta-feira, 12 de julho de 2012

A hipocrisia do ser

Para que servem esses píncaros elevados da filosofia, em cima dos quais nenhum ser humano se pode colocar, e essas regras que excedem a nossa prática e as nossas forças? Vejo frequentes vezes proporem-nos modelos de vida que nem quem os propõe nem os seus auditores têm alguma esperança de seguir ou, o que é pior, desejo de o fazer. Da mesma folha de papel onde acabou de escrever uma sentença de condenação de um adultério, o juiz rasga um pedaço para enviar um bilhetinho amoroso à mulher de um colega. Aquela com quem acabais de ilicitamente dar uma cambalhota, pouco depois e na vossa própria presença, bradará contra uma similar transgressão de uma sua amiga com mais severidade que o faria Pórcia. E há quem condene homens à morte por crimes que nem sequer considera transgressões. Quando jovem, vi um gentil-homem apresentar ao povo, com uma mão, versos de notável beleza e licenciosidade, e com outra, a mais belicosa reforma teológica de que o mundo, de há muito àquela parte, teve notícia. Assim vão os homens. Deixa-se que as leis e os preceitos sigam o seu caminho: nós tomamos outro, não só por desregramento de costumes, mas também frequentemente por termos opiniões e juízos que lhes são contrários. Michel de Montaigne, in 'Ensaios - Da Vaidade'
" A vida é apenas isto: um encadeamento de acasos bons e maus, encadeamento sem lógica, nem razão; é preciso a gente olhá-la de frente com coragem e pensar, mas sem desfalecimentos, que a nossa hora há-de vir, que a gente há-de ter um dia em que há-de poder dormir, e não ouvir, não ver, não compreender nada. " (Florbela Espanca).

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Um ser revoltante e falso

Quanta felicidade dá a grata suavidade das coisas! Como a vida é cintilante e de bela aparência! São as grandes falsificações, as grandes interpretações que sempre nos têm elevado acima da satisfação animal, até chegarmos ao humano. Inversamente: que nos trouxe a chiadeira do mecanismo lógico, a ruminação do espírito que se contempla ao espelho, a dissecação dos instintos? Suponde vós que tudo era reduzido a fórmulas e que a vossa crença era confinada à apreciação de graus de verosimilhança, e que vos era insuportável viver com tais premissas... que fazíeis vós? Ser-vos-ia possível viver com tão má consciência? No dia em que o homem sentir como falsidade revoltante a crença na bondade, na justiça e na verdade escondida das coisas, como se ajuizará ele a si mesmo, sendo como é parte fragmentária deste mundo? Como um ser revoltante e falso? Friedrich Nietzsche, in 'A Vontade de Poder'

O lado obscuro de cada um de nós

Passou no seu casamento por aquilo que é quase um facto universal - os indivíduos são diferentes uns dos outros. Basicamente, constituem um para o outro um enigma indecifrável. Nunca existe acordo total. Se cometeu algum erro, esse erro consistiu em ter-se esforçado demasiadamente por compreender totalmente a sua mulher e por não ter contado com o facto de, no fundo, as pessoas não quererem saber que segredos estão adormecidos na sua alma. Quando nos esforçamos demasiado por penetrar noutra pessoa, descobrimos que a impelimos para uma posição defensiva e que ela cria resistências porque, nos nossos esforços para penetrar e compreender, ela sente-se forçada a examinar aquelas coisas em si mesma que não desejava examinar. Toda a gente tem o seu lado obscuro que - desde que tudo corra bem - é preferível não conhecer. Mas isto não é erro seu. É uma verdade humana universal que é indubitavelmente verdadeira, mesmo que haja imensas pessoas que lhe garantam desejar saber tudo delas próprias. É muito provável que a sua mulher tivesse muitos pensamentos e sentimentos que a tornassem desconfortável e que ela desejava ocultar de si mesma. Isto é simplesmente humano. É também por este motivo que tantas pessoas idosas se refugiam na própria solidão, onde não serão incomodadas. E é sempre sobre coisas de que elas não desejariam estar muito cientes. O senhor não é, obviamente, responsável pela existência destes conteúdos psíquicos. Se, apesar disto, ainda for atormentado por sentimentos de culpa, reflicta então sobre os pecados que não cometeu e que gostaria de ter cometido. Isto poderá eventualmente curá-lo dos seus sentimentos de culpa relativamente à sua mulher. Carl Jung, in 'Cartas'

Filosofias de vida

A cada etapa da vida do homem corresponde uma certa Filosofia. A criança apresenta-se como um realista, já que está tão convicta da existência da peras e das maçãs como da sua. O adolescente, perturbado por paixões interiores, tem que dar maior atenção a si mesmo, tem que se experimentar antes de experimentar as coisas, e transforma-se protanto num idealista. O homem adulto, pelo contrário, tem todos os motivos para ser um céptico, já que é sempre útil pôr em dúvida os meios que se escolhem para atingir os objectivos. Dito de outro modo, o adulto tem toda a vantagem em manter a flexibilidade do entendimento, antes da acção e no decurso da acção, para não ter que se arrepender posteriormente dos erros de escolha. Quanto ao ancião, converter-se-á necessariamente ao misticismo, porque olha à sua volta e as mais das coisas lhe parecem depender apenas do acaso: o irracional triunfa, o racional fracassa, a felicidade e a infelicidade andam a par sem se perceber porquê. É assim e assim foi sempre, dirá ele, e esta última etapa da vida encontra a acalmia na contemplação do que existe, do que existiu e do que virá a existir. Johann Wolfgang von Goethe, in "Máximas e Reflexões"

Viver de Olhos Fechados

É propriamente ter os olhos fechados, sem jamais tentar abri-los, viver sem filosofar; e o prazer de ver todas as coisas que a nossa visão descobre não é comparável à satisfação proporcionada pelo conhecimento daquelas que encontramos por meio da filosofia; e, finalmente, esse estudo é mais necessário para regrar os nossos costumes e conduzir-nos por essa vida do que o uso dos nossos olhos para orientar os nossos passos. (...) Se desejamos seriamente ocupar-nos com o estudo da filosofia e com a busca de todas as verdades que somos capazes de conhecer, tratemos, em primeiro lugar, de nos libertar dos nossos preconceitos, e estaremos em condições de rejeitar todas as opiniões que outrora recebemos através da nossa crença até que as tenhamos examinado novamente; em seguida, passaremos em revista as noções que estão em nós, e só aceitaremos como verdadeiras as que se apresentarem clara e distintamente ao nosso entendimento. René Descartes, in 'Princípios da Filosofia'
"Eu não gosto de falar de felicidade, mas sim de harmonia: viver em harmonia com a nossa própria consciência, com o nosso meio envolvente, com a pessoa de quem se gosta, com os amigos. A harmonia é compatível com a indignação e a luta; a felicidade não, a felicidade é egoísta." ( José Saramago ).

Quando Está Frio no Tempo do Frio

Quando está frio no tempo do frio, para mim é como se estivesse agradável, Porque para o meu ser adequado à existência das cousas O natural é o agradável só por ser natural. Aceito as dificuldades da vida porque são o destino, Como aceito o frio excessivo no alto do Inverno — Calmamente, sem me queixar, como quem meramente aceita, E encontra uma alegria no fato de aceitar — No fato sublimemente científico e difícil de aceitar o natural inevitável. Que são para mim as doenças que tenho e o mal que me acontece Senão o Inverno da minha pessoa e da minha vida? O Inverno irregular, cujas leis de aparecimento desconheço, Mas que existe para mim em virtude da mesma fatalidade sublime, Da mesma inevitável exterioridade a mim, Que o calor da terra no alto do Verão E o frio da terra no cimo do Inverno. Aceito por personalidade. Nasci sujeito como os outros a erros e a defeitos, Mas nunca ao erro de querer compreender demais, Nunca ao erro de querer compreender só corri a inteligência, Nunca ao defeito de exigir do Mundo Que fosse qualquer cousa que não fosse o Mundo. Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"

quinta-feira, 5 de abril de 2012

O Irracional no Amor

Se é ridículo beijar uma mulher feia, também é ridículo dar um beijo a uma beleza. A presunção de que amando de uma certa maneira se tem o direito de rir do vizinho que tem outra maneira de amar, não vale mais do que a arrogância de certo meio social. Tal soberba não põe ninguém ao abrigo do cómico universal, porque todos os homens se encontram na impossibilidade de explicar a praxe a que se submetem, a qual pretende ter um alcance universal, pretende significar que os amantes querem pertencer um ao outro por toda a eternidade, e, o que mais divertido é, pretende também convencê-los de que hão-de cumprir fielmente o juramento.Que um homem rico, muito bem sentado na sua poltrona, acene com a cabeça, ou volte a cara para a direita e para a esquerda, ou bata fortemente com um pé no chão, e que, uma vez perguntado pela razão de tais actos, me responda: «não sei; apeteceu-me de repente; foi um movimento involuntário», compreendo isso muito bem. Mas se ele me respondesse o que costumam responder os amantes, quando lhes pedem que expliquem os seus gestos e as suas atitudes, se me dissesse que em tais actos consistia a sua maior felicidade, como é que eu poderia impedir-me de ver o ridículo de tal explicação - tal como o exemplo que há pouco dei; se bem que diferente, é certo -, enquanto tal homem não se resolvesse a pôr termo à minha hilaridade, confessando que esses gestos não tinham significação alguma. Num repente, com efeito, a contradição, que é a base do cómico, desaparece; porque não há nada ridículo em que uma coisa destituída de sentido seja reconhecida como tal, mas é grotesco atribuir-lhe um alcance universal. Em relação ao involuntário, a contradição reaparece: não é possível admitir o involuntário num ente racional e livre.

Soren Kierkegaard, in "O Banquete" (Discurso do Mancebo, sem experiência no amor)
O Efeito do Afastamento no Tempo O afastamento no tempo engana o sentido do espírito como o afastamento no espaço provoca o erro dos sentidos. O contemporâneo não vê a necessidade do que vem a ser, mas, quando há séculos entre o vir a ser e o observador, então ele vê a necessidade, como aquele que vê à distância o quadrado como algo redondo.

Soren Kierkegaard, in 'Migalhas Filosóficas'

sexta-feira, 23 de março de 2012

Quantos Séculos Precisa um Espírito para Ser Compreendido?

Os maiores acontecimentos e os maiores pensamentos – mas os maiores pensamentos são os maiores acontecimentos – são os que mais tarde se compreendem: as gerações que lhes são contemporâneas não vivem esses acontecimentos, - passam por eles. Acontece aqui algo de análogo ao que se observa no domínio dos astros. A luz das estrelas mais distantes chega mais tarde aos homens; e antes da sua chegada, os homens negam que ali – existam estrelas. “Quantos séculos precisa um espírito para ser compreendido?” – aí está também uma medida, um meio de criar uma hierarquia e uma etiqueta necessárias: para o espírito e para a estrela.

Friedrich Nietzsche, in "Para Além de Bem e Mal"
A Fonte da Felicidade Reside Dentro de Nós

O hábito de me recolher a mim mesmo acabou por me tornar imune aos males que me acossam, e quase me fez perder a memória deles. Desse modo, aprendi com base na minha própria experiência que a fonte da felicidade reside dentro de nós e que não está no poder dos homens fazer com que fique realmente desgostosa uma pessoa determinada a ser feliz. Por quatro ou cinco anos desfrutei regularmente de alegrias interiores que almas gentis e afectuosas encontram numa vida de contemplação.

Jean-Jacques Rousseau, in 'Devaneios de um Caminhante Solitário'

quinta-feira, 1 de março de 2012

ALBERT EINSTEIN

" Os grandes de espírito sempre acharam a oposição violenta dos medíocres. Estes últimos não conseguem entender quando um homem não se submete aos preconceitos hereditários, mas honesta e corajosamente usa sua inteligência."

" Poucos são os que enxergam com os próprios olhos e sentem com o próprio coração."

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Dialogo entre o personagem Walter Black e o entrevistador Matt
no filme:
Um novo Despertar.

Bem, as vezes Matt. Posso te chamar de Matt?
Sim, claro.
As vezes, uma ideia brilhante aparece no meio da noite.
Mas, seu gênio parece estar num boneco de pano, então as pessoas devem duvidar um pouco de sua sanidade.
Dizem que Mozart, costumava miar como um gato ocasionalmente... mas, ele se saiu bem. Ótimas músicas você não acha?
Walter, eu quero falar de depressão. Porque do jeito que me contaram, tudo isso começou como uma forma de lidar com sua doença mental.
Sim, isso mesmo?

- As vezes Matt, chegamos a um ponto que...
para seguir em frente...
Temos que começar do zero. começamos a nos ver como uma caixa na qual estamos presos.
Não importa o quanto tentamos escapar:
AUTOAJUDA, TERAPIAS, DROGAS...
Apenas nos afundamos mais e mais e, o único modo de fugir da caixa... é se livrar dela para sempre. Quer dizer, foi você mesmo que a construiu.
Quer dizer, se as pessoas ao seu redor oprimem o seu espirito, quem precisa delas?
Sua esposa que finge que te ama, seu filho que não te suporta.
Acabe com o sofrimento deles.
Começar de novo não é loucura, loucura é você ser infeliz. Andar por ai como um zumbi, desligado dia após dia...
Fingir que as coisas são como deveriam ser pelo resto de sua maldita vida. Toda a sua potencialidade, esperança, sentimento. Toda paixão que a vida sugou de você. Estique sua mão e agarre firme. Pegue de volta dos infelizes sanguesugas...

Esse é um retrato de Walter Black, um individuo irremediavelmente depressivo que se tornou o castor.
Tem muita gente lá fora desesperada para ouvir. as pessoas parecem adorar os desastres... em especial, quando não acontece com elas.