quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O Som e a Fúria - William Faulkner

“Todos trazemos dentro de nós um mundo de coisas: cada qual tem seu mundo de coisas.”
Essa frase, dita por um personagem de Pirandello, sintetiza bem o que nos é revelado em O Som e a Fúria: que uma mesma história assume diferentes aspectos quando contada a partir do ponto de vista de cada envolvido nela. Não necessariamente porque um minta e o outro diga a verdade, mas porque os eventos são assimilados de maneira distinta por cada “mundo de coisas”. Faulkner, através de quatro vozes narrativas, nos dá a conhecer a decadência da família Compson e a obsessão dos irmãos Benjy, Quentin e Jason pela figura da irmã, Caddy. Aos poucos, pelos olhos de cada um, vamos montando o quebra-cabeças do trágico destino que se abateu sobre eles. Uma verdadeira obra-prima!

Trecho 1
"Era o relógio de meu avô, e quando o ganhei de meu pai ele disse Estou lhe dando o mausoléu de toda a esperança e todo desejo; é extremamente provável que você o use para lograr o reducto absurdum de toda a experiência humana, que será tão pouco adaptado às suas necessidades individuais quanto foi às dele e às do pai dele. Dou-lhe este relógio não para que você se lembre do tempo, mas para que você possa esquecê-lo por um momento de vez em quando e não gaste todo seu fôlego tentando conquistá-lo. Porque jamais se ganha batalha alguma, ele disse. Nenhum batalha sequer é lutada. O campo revela ao homem apenas sua própria loucura e desespero, e a vitória é uma ilusão dos filósofos e néscios."

Trecho 2 (fala de Mrs. Compson a seu marido)
" (...) mas agora compreendo que ainda não sofri o bastante agora compreendo que tenho que pagar pelos seus pecados além de pelos meus o que foi que você fez que pecados que a sua família importante e poderosa jogou sobre a minha cabeça"

Trecho 3
"Há dias no final de agosto lá no Sul que são assim, o ar fino e ansioso assim, com algo de triste e nostálgico e familiar. O homem é o somatório de suas experiências disse o pai. O homem é o somatório de seja lá o que for. Um problema de propriedades impuras levado monotonamente até o nada invariável: impasse de pó e desejo."

Trecho 4
" (...) cada homem é árbitro de suas próprias virtudes você considerar o ato corajoso ou não é mais importante que o ato em si."

Trecho 5 (descrição da empregada negra Dilsey)
"Outrora fora uma mulher graúda, mas agora seu esqueleto vinha à tona, frouxamente encoberto pela pele solta que se apertava novamente sobre a barriga quase hidrópica, como se músculo e tecido fossem a coragem ou resistência que os dias ou os anos haviam consumido até que só restasse o esqueleto indômito, como uma ruína ou um marco que se elevasse sobre as entranhas sonolentas e inatingíveis, e no alto de tudo o rosto desabado que dava a impressão de que os próprios ossos estavam fora da carne, emergindo no dia implacável e exprimindo ao mesmo tempo fatalismo e a decepção atônita de uma criança, até que ela se virou, voltou para dentro da casa e fechou a porta."

FAULKNER, William. O som e a fúria.

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